terça-feira, 16 de junho de 2015

Estrela Radiante

Estrela Radiante (Brasil, 2013)
Diretora: Fabiana Servilha
Elenco: André Ceccato, Fabio Neppo, Valdano Sousa, Débora Muniz
Maquiagem: Fritz P. Hyde
SINOPSE: Um humilde homem do campo tenta entender o que aconteceu com seu amigo após este entrar em contato com um estranho objeto que caiu do céu.








Quando assisti pela primeira vez ao curta-metragem Estrela Radiante, durante o festival de aniversário de 13 anos do Boca do Inferno, impressionei-me com a técnica apurada, que diferenciava o curta dos demais exibidos naquele dia, não menos fantásticos. Além da técnica, durante e após o filme algo que não saiu de minha cabeça foram elementos do curta que remetem ao acidente radiológico que sempre me intrigou e assustou, envolvendo a contaminação com Césio-137, ocorrida no Brasil em 1987. Nele, um aparelho utilizado para radiografia contendo o elemento em sua forma radioativa foi encontrado por catadores em uma clínica desativada e aberto, liberando o composto responsável por contaminar toda uma região e causar a morte a curto e longo prazo de várias pessoas. Além do trágico evento, parte da trama também me lembrou do ótimo conto Eu Sou o Portal, de Stephen King, que lida com um astronauta tomado por um patógeno alienígena.

O enredo do curta segue um humilde homem do campo (André Ceccato), contando com a ajuda de um único amigo (Fábio Neppo), que o visita e lhe dá apoio, enquanto os outros habitantes da vila o excluem do convívio por ele ter sido tomado por um mal não identificável, que o deixa adoecido e cheio de feridas asquerosas pelo rosto e corpo (aliás, palmas para o trabalho de maquiagem de Fritz P. Hyde, conhecida figura no cinema nacional independente e diretor do impressivo Moroi). Merece menção a participação, ainda que curta, da veterana Débora Muniz, atriz de filmes como Perversão e Encarnação do Demônio.



Cuidando com muita atenção de todos os detalhes, a produção investe num crescendo de tensão e suspense, beneficiada pela trilha incidental bastante discreta e por planos cuidadosos e frequentemente longos que permitem estabelecer uma identificação do espectador com o que está ocorrendo, algo que seria prejudicado caso a diretora-produtora-roteirista, ao lado da montadora Fabiana Santos Ferreira, optassem por cortes rápidos.



Filmado com um orçamento muito modesto, feito em esquema de guerrilha e com muita força de vontade de Servilha, o curta extrai de todos os envolvidos um trabalho admirável, com destaque para a atuação de entrega de Ceccato, premiada no Festival ArtDeco, e a fotografia de Neo Distortion, que explora muito bem as luzes naturais, sombras e as paisagens do cenário campestre. O desfecho misterioso e arrepiante encerra de maneira correta todo o bom trabalho que vinha sendo apresentado até então.

Fabiana Servilha vem mostrando-se como uma das maiores promessas do horror nacional (nos curtas, ela já é uma realidade) e mal posso esperar para acompanhar os próximos trabalhos da talentosa cineasta paulistana.





NOTA: Crítica publicada originalmente no site Boca do Inferno

sexta-feira, 5 de junho de 2015

Lake Mungo (2008)

Lake Mungo (Austrália, 2008)
Diretor: Joel Anderson
Elenco: Rosie Traynor (June Palmer), David Pledger (Russell Palmer), Martin Sharpe (Mathew Palmer), Talia Zucker (Alice Palmer), Tania Lentini (Georgie Ritter), Cameron Strachan (Leith Ritter), Judith Roberts (Iris Long), Robin Cumming (Garret Long), Marcus Costello (Jason Whittle), Chloe Armostrong (Kim Whittle), Carole Patullo (Sargento Drouin), John Dunn (Diretor do Funeral), Laurie Dunn (Diretor no Funeral), Kirsty McDonald (Genevieve Trudeau), James Lawson (Frederick Rosskamp).
SINOPSE:  Alice Palmer morre acidentalmente numa represa local. Depois de o corpo ser reconhecido, os pais e o irmão começam a presenciar manifestações sobrenaturais em casa ou nas suas imediações. Começam a surgir várias fotografias e vídeos onde pode-se ver a silhueta da jovem. É iniciada então toda uma investigação paranormal que não só vai abalar a comunidade como vai desvendar o verdadeiro segredo por trás da morte de Alice.






Não sou fã de filmes found footage, produções que baseiam suas tramas em supostas filmagens encontradas, algo geralmente utilizado em produções de baixo orçamento (por exemplo, no ótimo A Bruxa de Blair e em Atividade Paranormal) e que procuram, em geral, evocar realismo através do recurso. Outra estratégia bastante utilizada por cineastas independentes, sobre a qual também tenho ressalvas, é o mockumentary, filmes que emulam documentários reais através de narrativas ficcionalizadas, onde atores profissionais interpretam fatos supostamente reais. Mas gostei muito de Lake Mungo, filme australiano não lançado no Brasil, nem comercialmente nos EUA, que mistura um pouco dos dois “subgêneros”. O Longa se apresenta como um documentário falso utilizando imagens encontradas de várias fontes (filmagens de celular, fotos, vídeos caseiros) e se sai extraordinariamente bem como um híbrido de horror sobrenatural e drama familiar.


"Se você nunca viu um fantasma...Olhe mais de perto"





Escrito e dirigido com por Joel Anderson, o longa acompanha os registros e depoimentos de uma família feitos para um documentário de TV. A família Palmer foi abalada com a morte da filha Alice, de 16 anos, encontrada afogada em uma represa na cidade de Ararat, Austrália quando a família passeava pelo local. Seus pais, Russell e June, e seu irmão Matt, abalados pela tragédia, não conseguem prosseguir com suas vidas uma vez que estranhos eventos sugerem que Alice ainda está presente na casa onde a família mora.





Joel Anderson utiliza com inteligência vários artifícios que nas mãos erradas poderiam gerar um terror barato e genérico. O principal deles é a aparição de Alice nas fotos e filmagens que seu irmão Matt faz, meses após sua morte. Anderson imediatamente usa o ceticismo que alguém imediatamente alegaria como argumento, para desacreditar tais aparições, e o que se segue no filme a partir de tal desmascaramento é uma sucessão de twists coerentes e perturbadores, que não pretendo revelar aqui. Revelações sobre segredos que Alice guardava, a culpa inequívoca que em geral sentimos após a morte de alguém que amamos, e uma apavorante subtrama envolvendo premonições e a aparição de um doppelganger (que gera a cena efetivamente mais sinistra do filme) fazem com que Lake Mungo consiga fugir do lugar-comum e constrói um longa que combina de forma orgânica o sentimento de luto de uma família com um horror misterioso que realmente incomoda o espectador. O diretor-roteirista intercala sabiamente os depoimentos de amigos e familiares de Alice (boas atuações no geral) com planos contemplativos e uma trilha dramática suave que marcam o sentimento de pesar que percorre todo o filme. O resultado é uma alegoria sinistra que consegue agradar os fãs de horror ao mesmo tempo em que não foge de sua própria lógica interna de documentário.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...