quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Estranhas Metamorfoses (1983)

Estranhas Metamorfoses (Xtro, Inglaterra, 1983)
Direção: Harry Bromley Davenport
Elenco:  Philip Sayer (Sam), Bernice Stegers (Rachel), Danny Brainin (Joe), Maryam D'Abo (Analise), Simon Nash (Tony), Peter Mandell (Palhaço), David Cardy (Michael), Anna Wing (Sra. Goodman), Robert Fyfe (Médico), Katherine Best (Jane), Robert Pereno (Ben), Tok, Tik, Susie Silvey (Mulher na cabana).
SINOPSE: O garoto Tony tem seu pai levado por seres extraterrenos num disco voador e fica traumatizado com a experiência. Porém o pai de Tony volta à Terra três anos depois em forma extraterrestre e depois assume uma forma humana e tenta então se aproximar do garoto, e sua esposa, agora casada com um outro homem.






Uma estranhíssima trama de abdução alienígena repleta de imagens repugnantes sem, no entanto, atingir um resultado regular ao longo de sua projeção



Só tomei conhecimento de Estranhas Metamorfoses há poucos anos, através de um gif sinistro bem conhecido do público de horror na internet, que mostrava um plano em primeira pessoa de um carro cruzando uma estrada, enquanto uma criatura estranha passava em frente ao veículo. Intrigado pela perturbadora imagem, coloquei o filme devidamente na lista, demorei, mas finalmente saciei minha curiosidade em conferir esse longa britânico que pegou carona no sucesso de filmes como Alien, O Oitavo Passageiro (1979), O Enigma de Outro Mundo (1982) e até mesmo de E.T. - O Extraterrestre (1982).
O filme tem início numa casa de campo onde Sam (Sayer) e seu filho Tony (Nash) brincam com sua cadela Katie, quando, de repente, o céu escurece e Sam é aparentemente abduzido. Cortamos para o presente, três anos após o incidente, Tony vivendo com sua mãe (Stegers), o padrasto (Brainin) e a babá Analise (D'Abo). Tony sofre de recorrentes pesadelos envolvendo o desaparecimento do pai, e ninguém acredita na versão do garoto, já que apenas ele estava presente no momento da abdução, e pensam que o pai simplesmente decidiu sumir da vida deles. Logo, porém, Sam decide retornar para o filho e a esposa, após acontecimentos não menos que bizarros.
Possuindo nos seus primeiros vinte minutos uma qualidade que infelizmente não se repete durante o restante de sua duração, Estranhas Metamorfoses investe boa parte de seu primeiro ato no retorno de Sam, e isso envolve a única sequência realmente memorável do longa, com a aparente chegada de uma nave extraterrestre e sua queda numa mata fechada, seguida do surgimento de uma repugnante criatura quadrúpede (aquela que aparece no gif). O tal E.T. ainda deixa um rastro de sangue enquanto se prepara para inseminar uma vítima (cena que emula o facehugger de Alien) que gerará Sam numa gravidez em tempo recorde. Criando um certo nível de mistério, essa primeira parte é capaz até mesmo de gerar sustos bem eficientes no espectador, além das imagens repulsivas bastante convincentes no design da criatura.
Quando Sam finalmente reencontra sua família, torna-se claro que há algo errado com ele (como se não bastasse a forma como ele voltou a este mundo) e todos em volta de seu filho Tony correm perigo. Desse momento em diante, o diretor Davenport e os roteiristas Cassie e Smith parecem querer enfiar todas as suas ideias dentro do filme, mesmo que estas não tenham absolutamente nenhuma função narrativa. Abraçando com força o trash e o exploitation, a lógica visual do filme se resume em aborrecidos diálogos que versam sobre a repentina de volta de Sam e degringolam a relação entre sua esposa e o padrasto de Tony; nudez gratuita (da futura bond girl D'Abo) e cenas estapafúrdias, como aquela que mostra a perseguição de um personagem por um tanque de brinquedo e até mesmo por uma onça preta (de onde saiu o bicho, ninguém sabe). Flutuando com irregularidade entre a imaginação fértil do filho (que não tem relação alguma com a trama de abdução) e as tentativas de Sam em se aproximar da esposa e do filho com fins escusos, o filme vale a pena por atingir uma singularidade em uma década repleta de filmes similares, apesar do resultado altamente irregular.


segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

O Sobrevivente (1987)

O Sobrevivente (The Running Man, EUA, 1987)
Direção: Paul Michael Glaser
Elenco: Arnold Schwarzenegger, Maria Conchita Alonso, Yaphet Kotto, Richard Dawson, Jim Brown, Jesse Ventura, Erland Van Lidth, Gus Rethwisch, Professor Toru Tanaka, Mick Fleetwood, Karen Leigh Hopkins, Edward Bunker, Anthony Pena.
SINOPSE: Num futuro autoritário, um homem erroneamente julgado culpado deve tentar escapar de sua execução pública, que será realizada durante um popular programa de televisão onde prisioneiros são perseguidos até a morte por excêntricos gladiadores.











O Sobrevivente é uma adaptação bastante livre do romance The Running Man, escrito por Stephen King em 1982 sob o pseudônimo de Richard Bachman. Interessante notar que dos cinco livros escritos usando o nome falso, King só entregou um romance de horror (A Maldição do Cigano). As outras obras contêm muito pouco ou mesmo nada em elementos sobrenaturais, e O Sobrevivente é um deles. A mudança de tom fez muito bem, especificamente nesse livro, que considero, talvez, o melhor de Bachman. Uma distopia elegante, rápida e furiosa sobre um futuro próximo onde a mídia controla a população e a televisão exibe vários programas que fazem o leitor pensar duas vezes na definição do que é, de fato, um reality show. O mais famoso desses programas chama-se The Running Man e envolve a perseguição implacável de um ou mais pobres loucos, geralmente da parte mais marginal da cidade, que se voluntariam para serem potencialmente trucidados por caçadores sádicos profissionais contratados pela emissora de TV e queridinhos do público sedento por sangue.



O filme se passa no ano de 2019, de acordo com o filme dois anos após uma recessão econômica global que deixou escassos os recursos naturais, comida e petróleo; e gerando um governo totalitário e milhões de pessoas vivendo em condições subumanas, tendo a Televisão controlada pelo Estado e todas as formas de arte censuradas. Ben Richards (Schwarzenegger) é um militar piloto de helicóptero que se recusa a cumprir ordens de atirar em uma multidão de pessoas que protestava por comida, e é preso pela insolência. Conseguindo fugir, ele se une a um grupo de dissidentes e acaba aceitando, sob ameaças, participar do jogo que dá nome ao filme. Lá ele e seus companheiros de ~guerrilha~ (Kotto e McIntyre) junto com a voluptuosa Amber (Conchita Alonso) devem não somente lutar por suas vidas, tendo a população torcendo contra eles e originais caçadores como o Sub-Zero (Tanaka), mas também buscam encontrar o satélite de transmissão da TV para desmascarar e tentar despertar o povo contra quem os controla.

Ainda que tematicamente bem menos complexo e ambicioso do que a obra que lhe serve de base, o longa comandado pelo então maior astro do cinema de ação, Arnold Schwarzenegger, acaba servindo como diversão de primeira, se desconsiderarmos qualquer relação com o romance. O roteiro formulaico e previsível não impede que o espectador se delicie com o clima oitentista-futurista (onde até mesmo fitas de VHS são vistas e o uso de celulares é inexistente) e com o carisma do elenco principal. Infelizmente falta coragem em transformar a produção em mais do que um mero passatempo.




Uma lista das várias diferenças entre filme e livro é mostrada a seguir (CONTÉM SPOILERS):
  • O filme se passa em 2019; o livro em 2015;
  • Enquanto o filme se passa na Califórnia o romance se passa na costa norte dos EUA, em estados como Nova York e Maine;
  • No livro Ben Richards entra voluntariamente no jogo, pois vive em uma zona paupérrima do estado e almeja ganhar o dinheiro para salvar sua filha e esposa, algo completamente diverso do perfil e das motivações de Richards no filme;
  • No livro Richards é rotulado como inimigo do estado, e tem trinta dias para sobreviver à caça, ganhando cem dólares por hora de sobrevivência, bem como mais cem para cada caçador morto por ele. Ele pode viajar para qualquer lugar do mundo, desde que deixe dois logs de sua trajetória gravados por dia.
  • Apesar de que, em ambas as obras, Richards tem a oportunidade de se tornar um dos caçadores contratados pela emissora, no romance o final é pessimista e não convencional, com Richards sequestrando um avião e se lançando contra o edifício dos Jogos, matando Killian e todos que lá estão.


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

As Vozes (2015)

As Vozes (The Voices, EUA/Alemanha, 2015)
Direção: Marjane Satrapi
Elenco: Ryan Reynolds (Jerry/Mr. Whiskers (voz)/Bosco (voz)), Gemma Arterton (Fiona), Anna Kendrick (Lisa), Jacki Weaver (Dra. Warren), Ella Smith (Alison), Paul Chahidi (Dennis Kowalski), Stanley Townsend (Xerife Weinbacher), Adi Shankar (John), Sam Spruell (Dave), Valerie Koch (Mãe de Jerry), Gulliver McGrath (Jerry jovem), Paul Brightwell (Padrasto de Jerry), Alessa Kordeck (Sheryl), Michael Pink (Jesus), Ricardia Bromley (Sheila Hammer).
SINOPSE: Jerry é um cara bacana que chama a atenção das garotas. Mas há um problema: ele conversa com o gato e o cachorro da casa. Mr. Whiskers, o felino, convence o protagonista a matar as mulheres com quem sai.








Contém pequenos spoilers

Combinar gêneros tão antagônicos como a comédia, o horror visceral e o drama psicológico é uma tarefa um tanto difícil. Como Stephen King escreveu uma vez sobre tais gêneros na literatura, em mãos inábeis uma comédia pode tornar-se um lamento fúnebre e o terror provocar o riso involuntário. Felizmente quando a mistura é bem feita, temos geralmente uma grata surpresa. Esse é o caso de As Vozes, filme cuja trama é centrada na pequeníssima cidade de Milton, onde o operário de uma fábrica de banheiras, Jerry (Reynolds) em constante acompanhamento psiquiátrico, acaba ficando obcecado por Fiona (Arterton), uma colega de trabalho, enquanto ouve os conselhos de seu gato e cachorro de estimação, que funcionam para ele quase como figuras do anjinho (o cão) e diabinho (o felino). Os problemas de Jerry começam quando um encontro amoroso toma um rumo inesperadamente mórbido.

Dominado por cores fortes, a começar com o pink berrante nos detalhes, uniformes e até mesmo nas empilhadeiras da fábrica onde Jerry trabalha, o desenho de produção de Udo Kramer (Caçadores de Emoção: Além do Limite) cria para o filme uma estética de mundo da maneira como o personagem enxerga, deixando claro ao espectador que a maior parte do que vemos se constitui numa fantasia criada pela mente problemática do protagonista, forçando inclusive uma aproximação psicológica com o rapaz, como também executado no remake de Maníaco (naquele tínhamos até mesmo a câmera subjetiva para ilustrar tal efeito). E a escolha do ator ajuda muito nessa identificação e empatia. Aqui Ryan Reynolds entrega uma de suas melhores performances, num papel que requer muitas nuances de interpretação. Repare, por exemplo, quando seu personagem explode no consultório de sua psiquiatra (a ótima Jacki Weaver) e logo em seguida exibe um comportamento mais calmo; já em outros momentos demonstra genuína ternura com a personagem de Anna Kendrick, ou um pesar profundo ao se lembrar de seu problemático passado; convencendo igualmente em todos esses momentos. Vale lembrar ainda que Reynolds foi o responsável pela dublagem das vozes do título. Ainda no elenco, homogeneamente interessante, temos Gemma Arterton como um genuíno interesse romântico, que apesar de nunca chegar a ser tridimensional, convence com seu charmoso sotaque britânico e carisma. Já Kendrick emprega mais uma vez sua meiguice no papel de Lisa, uma carente, porém apaixonada colega de Jerry.

O mais surpreendente em As Vozes, no entanto, é o equilíbrio perfeito entre o cômico e o trágico com que Satrapi (do premiado Persepolis) dirige o roteiro de Perry (responsável por, veja só, Atividade Paranormal 2). Em um momento, quando Jerry ouve batidas na porta de seu escuso lar, damos gargalhadas ao ouvir seu cão Bosco correr ao local dizendo "Eu levarei a bala por você, Jerry" ou "Eu te dou cobertura", sob protestos do gato Mr. Whiskers. Já em outro instante, quando o protagonista abre sua geladeira e percebe o que de fato se encontra lá dentro, somos imediatamente transportados para a cruel realidade junto com o personagem. Funcionando muito bem até os créditos finais (quando até mesmo Jesus Cristo é visto dançando Sing a Happy Song) e embalado por uma trilha sonora deliciosa de Olivier Bernet, o longa se configura como uma elegante comédia dramática, já que por trás das animadas vozes que preenchem o filme, encontra-se um pesado drama sobre uma mente perturbada.


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